quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Nina*

Dentro do ônibus o enjôo. Seu esôfago dialogava com seus pensamentos, seu estômago embrulhava tudo, a dor, o ódio, o sussurrar e a ansiedade. A estrada passava como um pesadelo em dó menor, da janela via-se tudo, menos a razão de estar ali. A menina entrou naquele automóvel na esperança de um talvez, talvez amanhã mais limpo, mais sadio... Quando era pequena sentia o suor frio deslizar pelas mãos enquanto segurava bem firme a cabeceira da poltrona da frente, aquele odor de gente humana e quente lhe subia às narinas remetendo a fatigação da existência humana. Para onde iam aqueles homens? Para onde iriam aquelas crianças de colo com seus biscoitos babentos? Aonde iriam parar todos aqueles olhos fechados da viajem? Seja aonde for, ela pensava sempre ir a um lugar bem melhor que eles. O suor ficava a cada segundo mais gelado, e sua ânsia percorria seu estômago até chegar perto de suas amídalas. Um cheiro peculiar de musk entranhava em suas narinas subindo ao cérebro, fazendo até lacrimejar os olhos... ela não podia mais aguentar, estava fadada a expulsar de si todos os sentimentos do automóvel.Iisso era de uma natureza tão maior, não cabia dentro dela. Lembro-me até hoje de ver a menina curvando a cabeça para fora da janela, no colo do pai... era assim que ela expulsava aquele odor terrível, era assim que ela se livrava do pior castigo sentimental. Com o estômago vazio a viajem passava mais depressa...