quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Um avental sujo de lágrimas

Era já bem tarde da noite, a vodegaaa caía bem, apesar de mais um ilustríssimo colega estar indo embora... A minha noite seria em claro, trocaria a luz do sol pela brisa fria que invadiria a janela do quarto da frente e o excesso de calor pelo moleton preto. A gente ama muitas pessoas, mas um dia todas elas vão embora. Vovó Afonsa foi embora, e isso me dá uma tristeza, ela iria gostar tanto de ver a sua casa reformada... Lembro-me como se fosse hoje, os dias cortantes de inverno, nós duas sentadas no alpendre aquecendo sol- como dizia ela- até uma hora da tarde. Ela pegava em minha mão com a desculpa de aquece-la, seus dedinhos chatos, mãozinha pequena e macia apesar de tanto trabalhar, e a aliança grossa que nunca tirava desde seu casamento tão suportado. Ela foi embora, eu tinha doze anos, e na época não me dei conta de que eu estava talvez perdendo a pessoa mais bondosa que eu poderia conhecer em toda a minha vida. Não tinha defeitos, não mesmo, pelo menos nunca notei e nunca ouvi ninguém falar que ela tinha um, a não ser sua conformidade para com seu meio. Sinto falta dela, me lembro de que dormi por uns quatro anos -os últimos de sua vida- no mesmo quarto que ela, e todo dia que antecedia um dia de uma prova no colégio, ela rezava, rezava com imensa fé e pedia ao Espírito Santo que me iluminasse, e eu nunca tirei menos que nove.
Afonsa é uma das pessoas que não precisariam ter morrido. Eu sei que todo mundo um dia vai embora, seja para Santa Catarina, seja para o céu, o inferno ou o túmulo que é só.
Nasce o dia e não dura mais que um dia. Eu sempre acho que a gente é que faz o nosso tempo e a nossa memória.

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