domingo, 17 de abril de 2011

Pão nosso de três dias

Chegava, e com ela a sensação de não pertencer ao ali. Tudo tão nebuloso, como em um sonho, ela acreditava piamente que só estava ali de passagem; e que nada daquilo era para ser vivido, pelo menos por ela... quanto aos outros, que se entregassem, que se esbaldassem e que se perdessem naquele sodomismo. E o que sempre lhe adjetivava... menina fresca, menina fresca. Pra tudo ela corria, para atender o telefone, comer, subir, descer, ouvir, só não corria para dormir e para sonhar. Algumas noites atrás, teve um dos piores sonhos, seu inconsciente havia processado tudo ao contrário, ou será que a sua realidade estava do avesso? Sonhou com o infortúnio delírio de ser amigável ao ser mais ordinário da face da terra. Não conseguia despertar, caiu da cama num ato desesperado e por misericórdia de deus. O que mais lhe repugnava era com certeza o desejo que alguns animais cultivavam e insistiam cultivar por ela. Um desejo sujo de carne e sangue.
Entrava e com ela a vontade de sair dali (ali aonde leitor?). Um universo paralelo ao seu, um tom desatinado comparado ao seu, - porque ela ouvia as vozes roucas no interior daqueles seres hipócritas - cheios dos outros e vazios de si. Naquela noite, detestou os bandos,de todas as tribos, odiou a repressão da individualidade e o medo que carregavam de estar sós, da necessiidade que os moviam: estar cercados de gentes o tempo inteiro e todo.
E na manhã seguinte, deu-se de cara com o espelho e também não se reconheceu, queria ter visto uma outra imagem, dela sem tinta e sem metais faciais, mas sabia que isso era tão impossível quanto lhe ter de volta. Voltou para a cama, mas sentiu como se estivesse no chão. Rolou três vezes - o canto da parede incomodava, não conseguia respirar bem; o lado do criado era inseguro, poderia cair dali; voltou ao canto da parede a adormeceu no tempo do quarto carneiro.
Acordaram, o sol e ela, a janela escancarada e um sol de rachar, tinha que partir pra vida, para a sua e para a dos outros. O dia só tinha onze horas, onze horas para entrar no universo alheio, comer,mastigar, digerir, engasgar. Poucas horas para passar conteúdo, dar aula, ver aula, mastigar e digerir aula. Tomar banho, lavar a alma, suar o corpo, pegar peso. Deu-se ao fim quatorze horas no final.
Alguns atos diários deveriam ser vomitados, então a menina
vomitou três vezes ao dia , na primeira vento, na segunda terror e na terceira um pedido obrigatório de misericódia!

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